segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Comecei dando aula na roça

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Eu nasci aqui em Três Corações, em 2 de abril de 1920. Estou com 88 anos. 
Meu pai era Izonel Andrade Junqueira, tinha o apelido de Guenel, e minha 
mãe era Baselissa Andrade Junqueira. Eles eram primos, os pais deles eram i
rmãos e as mães eram irmãs. Então eram praticamente primos e irmãos.
Antigamente, tinha muito isso: primo casar com prima. Até tio casava com 
sobrinha. 
Eu nasci em Três Corações mesmo, na rua do Luiza Gomes, José Alves Pereira, 
numa casa velha, comprida. Ali não tinha nada. Minha mãe sentava na porta de 
casa e a única coisa que avistava era o cemitério. Nossa casa ficava onde hoje 
mora o doutor Tomé. Nasci em casa mesmo, e nem era com parteira formada, 
era com curiosa mesmo. Nós éramos cinco irmãos. Meu pai morava na fazenda
Retiro, perto de São Bento Abade, e mexia com café e tudo quanto é plantação. 
Nesse tempo, a fazenda não tinha luz elétrica ainda. Em algumas fazendas já tinha. 
Lá, a gente usava lampião com querosene.
Engraçado que a única coisa que a gente comprava era querosene, vela e fósforo.
Porque depois que a gente deitava, apagava o lampião e ficava com a vela. 
Então, tinha castiçal nos quartos. De resto, nós tínhamos tudo na roça: 
feijão, arroz, verdura. A mamãe aprendeu a fazer polvilho com uma mandioca própria. 
Era na mão, muito complicado: tinha que raspar a mandioca e, depois,
passar na água. Eu nem me lembro mais direito. 
Eu até gostava de raspar a mandioca. Mas nós ficávamos mais na cidade. 
Tinha uma velhinha que tomava conta da gente, que se chamava 
Francisca Gomes, mas a gente falava Sá Chica. Meus irmãos ficavam 
com ela também; só o mais velho que morava com um primo do meu pai. 
Eu comecei a estudar com nove anos, porque eu era muito doente. 
Eu era muito magrinha, não comia, ficava o dia inteirinho quieta.
Minha mãe sempre dizia que eu era muito doente. Aos nove, dez anos é 
que eu comecei a engordar. Então, eu comecei a fazer o primário em um 
colégio particular, da dona Conceição Toledo12, perto da ESA. 
Ela tinha uma casa onde dava aula. Fiz os quatro anos do primário lá. 
Depois que eu terminei, eu queria entrar direto na escola normal. 
Pra isso, tinha que fazer dois anos de um curso que acho que
se chama fundamental.
Mas meu pai ouvia muito a opinião da minha tia Cândida de 
Andrade Junqueira. A gente chamava ela de Tia Doca, e ela 
era mãe da Maria Augusta Pereira e Abrahão. 
Ela era normalista e teve a primeira escola normal daqui, 
onde hoje é a Casa da Cultura. Meu pai perguntou o que 
ela achava de eu fazer o curso normal, e ela disse:
-  Não faz isso não, que ela vai estudar à toa. 
Põe ela na escola da dona Aída Rosa13 que, em um ano,
 ela passa no exame do normal e não precisa fazer os dois anos 
de fundamental.
Essa escola da dona Aída Rosa ficava na rua onde hoje tem
as casas dos militares. Estudei um ano nessa escola e, depois,
prestei exame pro curso normal. Passei, e fiz o normal em três anos. 
Eu queria fazer o ginásio, mas meu pai era muito antigo.
 Ele dizia:Ginásio não, ginásio é pra homem!
Antigamente não era como hoje. A gente fazia os quatro 
anos de primário e depois tinha o primeiro, o segundo,
 o terceiro e o quarto ginasial. Depois do quarto ginasial, 
a gente podia fazer só o terceiro ano do normal, que era a minha idéia. 
Eu achava que assim era melhor, eu estudaria mais, mas meu pai não
 aceitou, porque ginásio era pra homem. Então eu fiz o normal no colégio
do Monsenhor Fonseca, que ficava onde hoje é o edifício Real Passagem, 
pegando a rua Direita e a outra. Esse normal era pra se tornar professora. 
A gente aprendia as mesmas matérias: matemática, português, história, geografia.
 A diferença era a metodologia, a prática, a psicologia, que não tinha no ginásio.
 Do normal, não tem mais nenhum professor meu vivo. Minha professora 
de francês era a minha prima Hortência Junqueira, que morava na praça Pelé. 
Tinha a dona Maria José Coelho Neto, que me deu aula de metodologia e 
de matemática, por um tempo. 
O Antônio Azevedo também dava aula de matemática. 
Depois, ele se mudou pra Belo Horizonte e acabou morrendo por lá. 
O professor Sérgio Lemos era de geografia e história. E tinha o Chediak 
também. Depois, a dona Maria José saiu, e entrou a dona Isalina. 
A dona Corália, mulher do Orlando Rezende, também foi minha 
professora de geografia e história.Eu, toda vida, pensei:
“vou fazer o normal e vou lecionar”. Desde pequenininha, 
não sei se é porque a gente via a tia dando aula. 
Tentaram me fazer mudar de idéia, fazer concurso
pro correio, mas eu falei:Não, eu vou ser professora.
Comecei dando aula na roça, na fazenda do meu pai, 
pro primeiro ano primário. Era só eu de professora. 
A gente usava uma lousa pequena pra cada aluno.
Ela parecia uma pedra verde-escuro,  tinha um negócio próprio 
pra escrever, uma espécie de lápis. A Prefeitura dava esse 
material pra cada um. Ela ajudava porque os alunos eram mais pobres.
 E eu não deixava levar pra casa, tinha medo que quebrasse ou 
acontecesse alguma outra coisa. Aqueles que podiam comprar, 
compravam. 
Pra fazer o dever, cada um tinha um caderninho.
Até as mesas era a Prefeitura que dava. 
A gente punha uma mesa daqui, outra dali,
 e sentava três de cada lado, em cada mesa. 
Foi o meu pai que fundou a escola, e tinha mais filhos de
camaradas, de vizinhos. No primeiro ano, a gente só ensinava
 a ler e a escrever. Eu ensinava ainda com o método antigo, o Beabá, 
porque não sabia aplicar o método da Lili direito. Conforme, a criança 
levava mais de um ano pra aprender a ler. Isso foi em 1937, 1938.
Quando foi pra ter o segundo ano, meu pai morreu. Ele era diabético e, 
naquele tempo, a medicina não era tão avançada. Minha mãe não
quis ficar com a fazenda, então, vendeu ela. Nós viemos pra cidade,
e a Prefeitura me trouxe pro São Jerônimo. Lá, tinha aula pro 
segundo ano de manhã e pro primeiro, à tarde. Pra fazer o terceiro 
e o quarto, o aluno vinha pro Bueno Brandão, porque lá não tinha. 
Se achasse professora, 
até que teria o terceiro ano. Mas quem é que queria? Naquele tempo
 não tinha condução, você tinha que ir pro São Jerônimo a pé!
 A escola funcionava direitinho. Eu ia de manhã e a outra professora,
 Malvina Nogueira14, irmã do Jaime Nogueira, ia à tarde. 
Depois ela fez concurso pra Rede, e entrou outra no lugar dela. 
Lá, a gente ensinava do jeito que quisesse e eles aprendiam.
A gente dava castigo, mas eu não gostava não. 
Eu conversava muito com eles, e, antigamente, as crianças 
eram mais dóceis, mais mansinhas. 
Hoje tem aluno que até bate na professora! E não pode castigar!
Acho que fiquei no São Jerônimo só por dois anos,
porque depois eu fui nomeada pro Bueno Brandão. 
E eu comecei a fazer plano de aula no Bueno Brandão.
 A diretora era a Olímpia de Brito15. Depois que veio a 
Maria Augusta, melhorou muito, pois a dona Maria Augusta tinha
 o curso de especialização e, de quinze em quinze dias, ela pedia o plano. 
Ela falava se estava ótimo, bom, e, se estava ruim, 
ela falava:Que horror, isso é plano?
Nessa época, já não podia dar mais castigo, porque o governo
já não deixava mais. O castigo lá era assim: depois da 
saída das 11 horas, eles deixavam as crianças 40 minutos estudando.
E a professora ficava junto. Ela é que ficava de castigo. Mas, no recreio, 
a gente não podia dar castigo. Não podia privar as crianças do recreio, 
tinha que deixar elas brincarem. Eu dava aula pro primeiro e o segundo
ano do primário. E eu acho que o ensino de hoje está muito diferente. 
Às vezes eu encontro com uma mãe ou uma avó. 
Elas falam:Dona Lydia, o ensino está muito diferente. 
Mas diferente, como?
- Meu filho estudava no Bueno Brandão, fez primeiro, 
segundo, terceiro e quarto ano. Passou pro ginásio. 
Antigamente era primeiro, segundo, terceiro e quarto ano do ginásio. 
Agora, hoje, vai da primeira à oitava série, e os meninos fazem o 
quarto ano do primário, chegam no ginásio e são um fracasso!
Sabe o que eu acho? Os professores hoje ganham muito pouco e
 eles precisam lecionar muito. Então, eles não têm tempo de preparar aula. 
No primeiro ano, a gente não preparava, porque era só linguagem e aritmética, 
nem falava matemática. Já no segundo ano, entrava a história do município. 
E, no terceiro, entrava geografia, ciências e tudo mais. Então você tinha
que estudar, preparar a aula, montar um plano. E acho que hoje ninguém 
faz plano mais, porque não tem tempo. Eles dão aula no ginásio, 
depois vão pra universidade. E tem aluno que ainda não gosta de estudar!
Eu fiquei no Bueno Brandão por dez anos. Nessa época, aqui 
só tinha o Bueno Brandão de escola pública. Tinha escola particular, 
mas a maior parte não podia pagar os estudos. Então, pra ajudar o prefeito, 
a Maria Augusta fez três turnos do Bueno Brandão. Aí a coisa ficou feia. 
Das 7h às 10h30, eram o terceiro e o quarto ano. 
Às vezes, tinha ainda as duas classes de repetentes do segundo ano. 
Das 11h às 14h, eram o primeiro e o segundo ano de repetentes. 
Das 14h às 17h, eram só os iniciantes. Naquele tempo, não era como hoje, 
que tem a professora de matemática, a de português. 
Você dava tudo de todas as matérias. Você suava pra pôr o 
programa em dia, porque era muito difícil. Eu fiquei das 11h às 14h 
com a turma de segundo ano repetente. 
A dona Maria Augusta usou o salão pra sala de aula. No ano seguinte, 
ela foi distribuir as turmas, e me chamou num canto. 
Ela me deu uma lista de 48 alunos, do terceiro ano.
- São seus alunos do ano passado, do segundo ano. 
Tinha 42, mas eu promovi mais seis. E tem mais dois que os 
pais pediram transferência da Rede. Então você vai ficar com estes 
alunos do ano passado e mais oito de fora, repetentes também.
E, no ano que vem, você vai levá-los pro quarto ano.
- Dona Maria Augusta, coitadinhos deles. 
Eles vão ficar tristes quando me virem.
- Não tem nada disso. Eles vão ficar tristes só se você ou eu morrer. 
Mas você vai levar eles.
A gente trabalhava bem os repetentes. Sabíamos que eles eram mais fraquinhos.
Tinha alguns que tinham um pouco mais de vergonha e melhoravam.
Mas tinha aluno que era impossível. E eu não podia deixar aluno de castigo,
porque o governo não deixava. Mas eu levei essa turma só até junho, porque, 
depois, saiu a autorização do Estado pra fundar o Clóvis Salgado, na Cotia.
 Então fui pro Clóvis Salgado. Ele funcionava naquela casa dos dois leões,
e já tinha quarenta e tantos alunos, mas só cabiam uns 23. 
O colégio foi inaugurado no mesmo dia em que eu fui pra lá, 5 de junho de 1955.
 Ninguém queria ir pra lá, porque a Cotia era muito longe.
O povo falava que as professoras não queriam trabalhar lá porque tinham
 medo dos dois leões. A dona Maria Augusta me perguntou:
- Como é que é, você vai pro Clóvis Salgado?
- Eu vou pra onde o governo me mandar. 
Eu não passo de uma empregada!
Daí eu fui. Acompanhei a Iracema Lefort, que era diretora lá.
 Como a Cotia era muito longe, o governo aceitou que tivesse uma
diretora e uma vice-diretora. Por causa de ter começado em junho, 
a escola não abriu o quarto ano. Podia fazer matrícula até o terceiro, 
porque, se tivesse o quarto, ia atrapalhar muito os alunos.
Eu ficava só na secretaria. Ia de manhã, e a Iracema, à tarde. 
Fazia a escrita; a Iracema deixava escrito tudo o que tinha que fazer. 
Eu recebia gente da Secretaria de Educação. 
Cada professor fazia seu plano de aula, e a diretora só revisava, 
punha um visto. Tinha professora que não gostava de fazer plano de aula. 
A diretora então obrigava. De 15 em 15 dias, revistava, pedia o caderno pra ver. 
O controle era rigoroso. Se a professora entrasse dez minutos 
atrasada, não assinava a entrada, só a saída. 
As professoras tinham nota, e não eram promovidas se não tivessem notas boas.
Tinha os níveis, NA, NB, NC. Eu fui nomeada como NA, é o primeiro nível. 
Se eu tivesse nota suficiente, pontualidade, disciplina, 
seria promovida pro NB. Então, as professoras tinham medo, 
eu até nem sei por quê. Quem tem faculdade, ganha mais um pouco, 
mas eu não fiz, porque quando a faculdade veio pra cá, eu já tinha aposentado. 
Eles queriam que eu fizesse, mas eu disse:
- Uai, não! Deus me livre, voltar a calçar sapato!
 Eu não vou lecionar mais, chega! Eu não vou virar pro dinheiro agora!
Quando eu me formei, não tinha faculdade, não tinha nada. 
A professora já formava, tratava de trabalhar ou arranjar outro emprego.
 A mulher ia ser professora ou dona de casa. 
Tinha umas que casavam logo… davam essa sorte. 
Até que minhas colegas de profissão eram muito ativas, eram 
promovidas, cumpriam bem o dever que tinham e com satisfação.
* * *
Em 1955, eu fui escalada pelo secretário pra fazer 
matrícula aqui na cidade. Eu achei esquisito, 
porque já tinha sido escalada pra fazer matrícula no Clóvis Salgado,
 e naquele tempo só tinha o Clóvis Salgado e o Bueno Brandão
Perguntei pra diretora do Bueno Brandão, mas ela não sabia de nada. 
No dia 20 de janeiro, eu fiz essa matrícula sozinha, e estava assim de criança. 
Fiquei até às seis da tarde e saí  com a mão inchada de tanta matrícula.
 Disseram pra eu levar pro prefeito. Mostrei a matrícula pra ele, mas
 depois nem fiquei sabendo de mais nada. Um ano depois, eu ainda 
estava no Clóvis Salgado, quando tocou a buzina. 
A buzina tocava quando tinha alguma notícia extraordinária.
 A cozinheira me contou que tinha sido criado mais 
um grupo emTrês Corações, chamado Luiza Gomes Lemos. 
Eu falei:Ah, isso é mentira, gente!
- Uai, dona Lídia, mas deu no rádio.
Então o Jorge Avelar deu a notícia de que foi mesmo inaugurada 
uma escola na cidade. Fizeram a nova escola porque o
 Bueno Brandão e o Clóvis Salgado sozinhos não estavam 
dando conta do tanto de criança que tinha. 
O nome Luiza Gomes Lemos é da mãe da dona Sarah Kubitschek, 
que foi quem fez o grupo. Mas não podia pôr o nome da dona Sarah, 
porque ela ainda era viva. Eu não me lembro se o Juscelino era presidente 
ou governador na época. Então teve uma festa de formatura no Bueno Brandão. 
A Maria Augusta ficou muito alegre. O nosso chefão de 
Belo Horizonte era muito chato, ninguém gostava dele. 
Mas a Maria Augusta tinha convidado ele pra ser paraninfo do quarto ano. 
Tinha dois grupamentos: o primeiro, das cidades perto de
 Belo Horizonte, e o segundo, do interior. 
O nosso chefe era o do segundo grupamento. 
Eu morava aqui na Biquinha e a Iracema me disse:Você vai na festa do grupo.
- Uai, eu não! Não vou não.
- Você vai sim, porque vai ficar na mesa como diretora, e eu 
vou ficar no corredor. Naquele aperto, ficar em pé pra ouvir discurso,
eu não vou ficar não. Vamos conhecer nosso chefe.
- Eu não vou porque ele é muito chato.
E tinha muita gente também. Eram quatro quartas séries,
 com muita criança, e ainda junta pai, irmão e irmã. 
Deus me livre! Não fui. No outro dia, eu estava em casa 
fazendo almoço. Meu irmão chegou e falou assim:
- Estive com a dona Santinha, servente do Clóvis Salgado,
 e ela mandou um abraço pra você.
- Muito obrigado.
- Você não vai perguntar porque ela mandou o abraço?
- Uai, é porque agora é férias.
- Não. Não é por causa disso não. É porque dizem que 
você foi nomeada diretora do Luiza Gomes.
- Isso é mentira!
No outro dia, minha prima Odila Junqueira apareceu:
- Vamos pra roça?
- Vamos embora, não tem por que eu ficar aqui.
Eu não tinha acreditado na conversa. Fiquei lá na roça, 
e já estava no sexto dia naquele bem-bom, tomando leite gordo, 
e recebi um bilhete da minha mãe. Ela falou que o juiz de paz,
 Domingos Vilela, disse que era pra eu tomar posse. Eu falei:
- Ah, não é possível!
A gente chamava o Domingos de seu Minguinho.
E ele tinha uma farmácia. Eu fui lá na farmácia dele e ele disse:
- Dona Lydia, a senhora foi nomeada, a chave até está comigo. J
á conversei com o prefeito, a senhora vai tomar posse. 
Já está desligada do Clóvis Salgado. Agora a senhora é do Luiza Gomes.
Então eu tive que ficar na cidade. Tomei posse na farmácia do seu Minguinho. 
Isso foi em 16 de dezembro de 1956.  Eu nem aproveitei as férias.
Em janeiro, teve a matrícula e aí começou a funcionar a escola. 
Ela ficava numa casinha de madeira, parecia casinha de pombo, 
era uma gracinha! Quando eu fui diretora, fiquei com fama de louca,
porque chamei pra trabalhar professoras todas novinhas. 
A mais velha não tinha mais de 21 anos. Falaram pra eu
 chamar mais velhas, mas eu falei assim:
- Uai, elas têm que começar aprendendo a ter responsabilidade,
 a cumprir bem os deveres.
Só tinha uma professora mais velha: a Nenzinha. 
Ela já não podia ser nomeada mais, porque já tinha 
passado da idade. Eu fui a Belo Horizonte, na Secretaria 
de Educação, pra conversar. Eles me disseram
- Enquanto você não achar professora, ela vai ficando com você. 
E você explica pra ela. Mas no dia em que uma professora 
te procurar atrás de trabalho, você tem que dispensar ela.
E ela ficou. Chegaram até a falar que a Nenzinha era a avó, 
eu era a mãe e as professoras eram as filhas.
No começo, a gente sempre fazia as festas comemorativas 
no grupo mesmo: dia das mães, dia dos pais, dia das crianças. 
Tinha bailinho, as crianças eram muito pobres, então cada 
professor dava um prato. No 7 de setembro, a gente não marchou 
no primeiro ano porque não tinha os instrumentos. 
Aí o coronel da EsSA mandou alguns e chamou uns 30 alunos
 pra aprender a marchar. Os alunos gostavam muito! Mas depois o
coronel achou melhor tirar os pequenininhos. 
Eles ficaram bravos, porque queriam marchar. 
Mas só ficaram os do segundo ano.
O ano atrasado teve festa de Jubileu de Prata no Luiza Gomes. 
Fui homenageada como primeira diretora da escola, mas 
essa homenagem é das professoras. Se eu não tivesse as professoras, 
como que eu ia fazer? A dona Elisa Lemos foi vice-diretora. 
Ela sempre falava: Dona Lydia, conserva esse grupo pequenininho, 
sempre pequeno. Naquele tempo, o José Naback era chefe do posto de saúde. 
Ele ajudava muito a escola com remédios. 
Quando adoecia uma criança, a gente levava lá e ele olhava. 
O prefeito Américo Dias16 também deu muito apoio.
Sempre que ele ia a Belo Horizonte, passava na escola e 
perguntava se não estávamos precisando de nada. 
O reitor da Universidade, o professor José Maria, também 
foi muito bom pra mim. Ele era padre e capelão também, e sempre me dizia:
- Com a minha autoridade, você pode entrar onde você quiser.
As crianças costumavam falar nome feio. Eu falava:
- Que coisa feia!
Mas é que eles vinham com aquilo de casa. Só duas vezes tive de
 expulsar aluno da escola, e, mesmo assim, com muita dor no coração.  
Apesar disso, naquele tempo, as crianças eram mais obedientes. 
Tinha uns rebeldes, que a gente precisava trazer mais junto, 
mas as crianças eram mais obedientes. Agora, hoje, está demais. 
Criancinha de 12, 13 anos não obedece o pai, não obedece a mãe. 
O mundo está muito diferente. Eu não sei se é porque eu já estou velha. 
Mas as crianças estão muito sabidas.

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